Ao realizar aplicações financeiras em uma empresa, é preciso ter o cuidado de que sejam observados os mais diferentes aspectos da negociação para garantir não só o retorno esperado pelo investidor, como também a segurança da operação.
Quando se trata da aquisição de uma debênture — ou seja, um título de dívida emitido por uma companhia —, esse papel cabe ao agente fiduciário: instituição financeira especializada em proteger os interesses de quem investe nessa modalidade de renda fixa.
Logo, compreender de que forma atua esse tipo de instituição, quais suas obrigações, papel, normas de regulamentação, entre outros, é essencial tanto para quem pretende ingressar na área, quanto para investidores no geral.
É justamente para te ajudar a entender os pormenores desse termo tão importante, eliminando todas as dúvidas que você possa ter sobre o assunto, que te convido a seguir comigo ao longo deste artigo!
O que é agente fiduciário?
No mercado de capitais, agente fiduciário é como são denominadas as instituições financeiras responsáveis por defender os direitos de quem investe em debêntures e demais títulos de dívida, como Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI) e do Agronegócio (CRA) e Letras Imobiliárias Garantidas.
A contratação de um agente fiduciário, inclusive, é um dos requerimentos legais que uma companhia necessita cumprir para poder captar recursos por meio da emissão de títulos.
Essa atividade foi criada pela Lei 6.404 de 1976, a chamada Lei das sociedades anônimas, e pode ser exercida por agentes e demais entidades financeiras autorizadas pelo Banco Central do Brasil (Bacen). Por sua vez, sua atuação é regulada pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), que garante o bom cumprimento de suas funções.
De maneira resumida, é possível dizer, portanto, que a função do agente fiduciário é assegurar a integridade da negociação de uma debênture.
Para isso, entre outras coisas, esse agente se dedica a:
- Munir os investidores de informações relevantes sobre a dívida e a empresa emissora;
- Analisar e comunicar possíveis irregularidades dos títulos;
- Supervisionar o bom cumprimento do que foi acordado entre credores, devedores e garantidores, mantendo a segurança dos bens que estão sob sua custódia.
Isso, porém, é apenas um resumo introdutório de suas obrigações e papel na transação de um título. Mais adiante, vou te explicar mais sobre o assunto.
O que quer dizer a palavra fiduciário?
O substantivo fiduciário tem sua origem no latim “fiduciarius“. Segundo a etimologia, esse termo representa “algo mantido em confiança“, sendo um derivativo de “fiducia“, “ato de acreditar ou confiar”, e de “fides“, “confiança, fé“.
Segundo o dicionário Priberam da Língua Portuguesa, fiduciário tem cinco principais significados, sendo os dois últimos de uso comum ao sistema jurídico:
1. Quem revela confiança;
2. Quem depende da confiança ou da reputação;
3. Quem representa ou age em nome de outrem;
4. Quem tem transferidos para si ou faz parte da transmissão de direitos
ou bens de terceiros;
5. Quem está sujeito à disposição testamentária em que um herdeiro ou legatário é encarregado de conservar e, por sua morte, transmitir a outrem a sua herança ou o seu legado.
Desse modo, no que tange ao mercado de capitais, o agente fiduciário pode ser interpretado como o responsável por garantir ao credor (o investidor) que o valor “emprestado” (a compra de uma dívida), será devolvido pelo devedor (a empresa emissora), com o acréscimo das taxas estabelecidas em acordo.
Qual é o papel do agente fiduciário de uma debênture?
O principal papel do agente fiduciário de uma debênture é assegurar a integridade do título em questão, defendendo os interesses do debenturista (ou seja, do credor/investidor). Sua missão é assegurar o acordado entre a empresa emissora, o investidor e o garantidor.
Mesmo que as debêntures, enquanto títulos de renda fixa, possuam retornos pré-definidos, muitos pontos devem ser observados pelo investidor de modo que não lhe restem dúvidas sobre sua aplicação. Nesse sentido, o agente fiduciário o auxilia a compreender informações importantes como:
- Especificidades da debênture;
- Prazos de retorno;
- Saúde e histórico financeiro da companhia;
- Valores referentes à taxa de juros.
De modo a amparar o debenturista com informações atualizadas acerca da debênture adquirida e da empresa emissora, a rotina de um agente fiduciário também inclui outras tarefas, tais quais:
- Atualizar os debenturistas sobre os rendimentos de seus títulos;
- Estudar os demonstrativos financeiros divulgados pela companhia;
- Investigar a integridade das garantias da debênture;
- Elaborar e enviar aos debenturistas um relatório periódico com todas as informações relevantes acerca da debênture no período.
Quais os deveres de um agente fiduciário?
O maior dever legal de um agente fiduciário é prezar pelos direitos e interesses de investidores na compra de debêntures. Essa, porém, não é nem de longe a sua única obrigação.
De acordo com o Artigo 11, presente no Capítulo III da Resolução CVM Nº 17, a qual regulamenta a atividade dos agentes fiduciários, essas instituições financeiras contam com um total de 23 deveres.
Entre eles, estão:
- Exercer suas atividades com boa fé, transparência e lealdade aos titulares da dívida;
- Renunciar à função, na hipótese de conflito de interesses ou de qualquer outra possibilidade de inaptidão, realizando a convocação imediata de assembleia;
- Manter em segurança todos os documentos relativos ao seu exercício;
- Ao aceitar a função, verificar a autenticidade das garantias e a consistência de todas as demais informações presentes na escritura de emissão;
- Opinar sobre a suficiência ou não de informações em propostas de modificação de condições de valores mobiliários;
- Examinar e manifestar opinião sobre propostas de substituição de bens dados em garantia;
- Intimar, conforme a situação, o emissor, o cedente, o garantidor ou o coobrigado a reforçar as garantias em casos de deterioração ou depreciação;
- Solicitar, sempre que achar necessário, auditoria externa sobre a empresa emissora ou seu patrimônio;
- Comunicar os debenturistas acerca de eventual inadimplência do emissor quanto a obrigações financeiras assumidas na escritura de emissão;
- Averiguar os procedimentos adotados pelo emissor para comprovar a existência e integridade dos valores mobiliários.
Quais normas regulam a atuação dos agentes fiduciários?
O Bacen é o responsável por autorizar o exercício de entidades financeiras enquanto agentes fiduciárias. A atuação desses é regulada ainda pela CVM.
Esses não são, no entanto, os únicos órgãos do mercado financeiro que podem nortear os limites da atividade de um agente fiduciário.
Um exemplo disso é a Resolução n 4.647, de 2018, editada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), que adicionou um novo requisito para o exercício de agentes em operações relativas à emissão de Letras Imobiliárias Garantidas (LIG), além de definir hipóteses em que o Bacen pode cancelar a autorização de securitizadoras para atuar como agentes fiduciários na emissão de LIGs.
Entre as principais leis e normativas vigentes que delegam sobre o exercício do agente fiduciário estão:
- Lei nº 6.385: regulamenta o mercado de valores mobiliários e origina a Comissão de Valores Mobiliários (CVM);
- Lei n° 6.404 ou “Lei das S/A”: introduz a figura do agente fiduciário em emissões de debêntures;
- Resolução CVM 51: determina o cadastro de participantes do mercado de valores junto à Comissão de Valores Mobiliários;
- Ofício-Circular 03 CVM/SRE: presta orientações acerca do Sistema de Cadastro para Agentes Fiduciários;
- Resolução CVM 17: regulamenta o exercício da função dos agentes fiduciários;
- Resolução 4.647: regra a emissão de Letra Imobiliária Garantida (LIG);
- Resolução CVM 60: orienta o exercício das companhias securitizadoras registradas na CVM, assim como a emissão pública de títulos de securitização;
- Lei 14.430/22: estabelece o novo marco legal da securitização;
- Código ANBIMA para Ofertas Públicas.
Várias normas, não é? Esse conjunto todo é bem importante, já que é o resguardo legal para que sejam garantidas a integridade e a segurança de todos os agentes envolvidos na operação de emissão e compra de uma debênture. Em outras palavras, mais um grande e complexo mecanismo desenvolvido para que o mercado financeiro funcione dentro dos conformes.
Quem pode ser agente fiduciário?
Como previsto pela Comissão de Valores Mobiliários, somente as instituições financeiras autorizadas pelo Banco Central do Brasil podem prestar o serviço de agente fiduciário.
É preciso ainda que essas instituições tenham, obrigatoriamente, por objeto social a administração ou a custódia de bens de terceiros. Por fim, é necessário o cadastro no Sistema de Agentes Fiduciários da CVM.
Quem não pode atuar como agente fiduciário?
Além de esclarecer quem pode atuar como agente fiduciário, a resolução vigente também assinala impedimentos para o exercício da atividade.
Segundo o disposto, a empresa que pretende prestar esse tipo de serviço não pode:
- Prestar assessoria de qualquer natureza ao emissor, sua coligada, controlada, controladora, ou sociedade integrante da companhia;
- Ser coligada ao emissor;
- Ser coligada ou controlada por sociedade que atue como distribuidora da emissão;
- Não pode ser credora da empresa emissora ou de sociedade controlada por ela;
- Ter controladores ou administradores que tenham interesse no emissor;
- Possuir 10% ou mais do capital votante pertencente ao emissor, a seu administrador ou sócio;
- Que esteja, de qualquer outra maneira, em situação de conflito de interesses.
O regulamento ainda prevê que o agente fiduciário pode atuar em mais de uma emissão da mesma empresa, desde que preste o mesmo tratamento e atenção a todos os debenturistas, respeitando as garantias, obrigações e direitos assumidos em cada um dos contratos.
Já a empresa que contratar o mesmo agente fiduciário para mais de um título é obrigada a explicitar essa informação na escritura da emissão, ou no termo de securitização de direitos creditórios. Cabe ainda à emissora o papel de tornar essa informação pública em eventuais prospectos de oferta.
Quais são os documentos necessários para a nomeação de um agente fiduciário?
Para poder atuar como agente fiduciário, além da autorização do Bacen, a instituição financeira interessada necessita de cadastro no Sistema de Agentes Fiduciários da CVM.
Para que o cadastro seja realizado, é necessário apresentar os seguintes documentos:
- Dados gerais (site, denominação social, denominação comercial, data de início e CNPJ);
- Diretor indicado para contato;
- Endereço e contatos.
Vale destacar que é dever do novo agente fiduciário atualizar os dados fornecidos que sejam eventualmente alterados, em um prazo máximo de sete dias úteis. É preciso, ainda, que a instituição confirme junto à CVM a continuidade da validade das informações cadastrais até o dia 31 de março de cada ano.
O último passo para exercer a função em uma debênture é a nominação do agente fiduciário na escritura de emissão ou no termo de securitização de direitos creditórios, segundo o previsto na Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (ANBIMA).
Agente fiduciário pode ser pessoa física?
Segundo a Instrução CVM 17, de 2021, a função de agente fiduciário é delimitada a instituições financeiras previamente autorizadas pelo Banco Central do Brasil, que tenham como objeto social a administração ou a custódia de bens de terceiros.
Sempre que especificado em lei, a atividade de agente fiduciário também pode ser exercida por outras entidades autorizadas pelo Bacen.
Desde 2016, a CVM veta pessoas físicas de prestarem esse serviço.
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