O que significa heurística?

A heurística é o termo usado para se referir aos atalhos mentais utilizados pelas pessoas. Em outra palavra, é o processo inconsciente de simplificar a compreensão sobre questões complexas, se baseando em experiências passadas ou crenças próprias.

Em geral, um indivíduo recorre a este atalho quando precisa tomar uma decisão ou responder a uma pergunta sem ter informações completas suficientes para tal, ou quando está em um momento de incerteza. 

Oficialmente, também podemos chamar a heurística de viés cognitivo. A “prática” tem origem nos primórdios, quando os seres humanos agiam principalmente por instinto, não baseados em estatísticas.

À época, sobreviver era o objetivo mais importante. Para isso, o cérebro desenvolveu maneiras de solucionar problemas rapidamente, sem gastar muita energia. Afinal, por mais que o órgão consuma 20% da energia do nosso corpo, é também predisposto a economizá-la sempre que possível.

Embora a heurística seja uma capacidade notória nas pessoas, pode levar alguém a erros e equívocos, especialmente em situações onde são necessários dados e provas reais para tomar uma boa decisão — no mercado financeiro, por exemplo.

Como funciona a heurística?

Diante de uma decisão, o cérebro humano vai recorrer primeiro a achismos, experiências passadas, lembranças e emoções de grande impacto em vez de se valer de informações e estatísticas reais.

Dois dos principais autores que explicam o funcionamento da heurística são os psicólogos israelenses Tversky e Kahneman, que publicaram, em 1974, um estudo chamado Judgement under uncertainty: heuristics and biases (em português, “Julgamento sob incerteza: heurística e vieses). 

Nele, exploram como as pessoas têm a tendência de estabelecer julgamentos e fazer estimativas com base nos primeiros pensamentos que vêm à mente em determinado contexto. Dessa maneira, opiniões do tipo geralmente são expressadas com frases que iniciam com “as chances disso são…” ou “é improvável que…” e nunca são acompanhadas por fatos comprovados.

Embora a heurística se desdobre em vários tipos, em geral, experiências passadas e emoções fortes são as principais causas dessa distorção cognitiva

Por exemplo: embora as chances de um avião cair sejam menores do que um acidente de carro acontecer, as pessoas sentem mais medo de voar, já que as notícias sobre quedas causam um choque maior do que aquelas sobre acidentes nas estradas, que são mais recorrentes.

Do mesmo modo, um investidor que tenha tido sucesso em uma aplicação no passado tende a repetir a estratégia no futuro, acreditando que a probabilidade de o feito se repetir é alta. No entanto, ganho passado nunca é garantia de lucro futuro.

Qual a importância da heurística?

Historicamente, a heurística tem sido importante principalmente por questões de sobrevivência. Com ela, os seres humanos desenvolveram e aprimoraram a capacidade de agir rapidamente em situações críticas.

Atualmente, embora as pessoas ainda a utilizem inconscientemente para simplificar questões complexas, este viés cognitivo pode levar alguém ao erro — logo, compreender o conceito é fundamental para evitar esse comportamento sempre que possível, especialmente em contextos de grande relevância.

Quais os principais tipos de heurística?

Embora seja resumidamente descrita como um conjunto de atalhos mentais, a heurística pode se manifestar de diferentes maneiras, a depender de como uma pessoa se comporta em um momento de incerteza. Por isso, existe em diferentes formas e com várias nomenclaturas, como heurística da disponibilidade, da escassez, da ilusão de frequência, entre outros.

Abaixo, conheça as mais comuns:

Disponibilidade ou acessibilidade

Nesta primeira categoria, o cérebro resolve uma questão buscando a primeira referência ou ideia que surgir à mente, com base em experiências passadas similares. 

Se alguém te perguntar sobre o nível de segurança da sua cidade, por exemplo, é mais provável que dê uma resposta com base na sua vivência — ou de pessoas próximas — do que em estatísticas reais.

Essa categoria também é chamada de heurística da memória ou da imaginação. Neste segundo, a técnica utilizada pelo órgão é adotada quando não há nenhuma lembrança específica a ser recordada, então é preciso “inventar” cenários para preencher essa falta de informação. 

Por exemplo: alguém que vá viajar e não conheça muito sobre o destino pode simplesmente supor situações de risco que julga serem possíveis, em vez de fazer uma pesquisa aprofundada sobre a segurança local.

Take the best

Adaptando para o português: escolher o melhor. Esse atalho consiste no ato de ponderar duas ou três alternativas na hora de tomar uma decisão, se baseando unicamente em uma única característica positiva de cada, ignorando os atributos negativos.

Nosso cérebro utiliza essa estratégia principalmente em situações onde há muitas opções disponíveis. Ao fazer uma compra online, por exemplo, um indivíduo pode se concentrar apenas nas vantagens de cada produto, deixando de lado possíveis desvantagens ou detalhes menos favoráveis, para tomar uma decisão mais rápida e simplificada.

Tallying ou trade-off

Esse tipo de heurística se assemelha ao take the best, porém, as opções apresentam o mesmo peso. Para fazer uma escolha, então, o indivíduo vai eleger aquela que oferecer o maior número de “sinais” de que é a melhor.

Por exemplo: ao decidir entre duas marcas de smartphones, um consumidor pode usar a estratégia do tallying. Assim, vai considerar vários aspectos, como câmera, desempenho, preço e design. 

Se uma marca se destacar em três desses aspectos, enquanto a outra se destaca em apenas dois, ele provavelmente escolherá a primeira, mesmo que os aspectos sejam igualmente importantes para ele.

Representatividade

Esse modelo de heurística consiste na prática de categorizar pessoas e objetos, a fim de fazer julgamentos e previsões com base nessa classificação. As categorias, por sua vez, surgem a partir de crenças e opiniões próprias e não necessariamente condizem com a realidade

Em termos mais simples, é como dispor indivíduos e ideias em “caixas” e não cogitar que eles possam se manifestar de maneira diferente daquela que foi deduzida inicialmente.

Imagine que alguém associe erroneamente o uso de óculos ao grau de inteligência. Ao conhecer alguém de grande inteligência, mas sem o acessório, essa pessoa pode ignorar a característica positiva, simplesmente por não se encaixar no arquétipo criado mentalmente para identificar aqueles que são inteligentes. 

Escassez

Aqui, o cérebro tende a aumentar o valor de determinado objeto se o perceber como escasso. Assim, tudo aquilo que parecer menos acessível será automaticamente tido como mais valioso.

Um exemplo clássico é a estratégia de marketing utilizada por inúmeras lojas e prestadores de serviços. Ao divulgar qualquer bem ou serviço afirmando que “são as últimas unidades” ou que “restam poucas vagas”, fazem o público crer que a oferta é irresistível e deve ser aproveita longo, antes que acabe — mesmo quando a escassez não é real.

Ilusão de frequência

Por fim, temos outro tipo de heurística associado às armadilhas das memórias armazenadas pelo cérebro. Nesse caso, tendemos a dar um fato como certo (ou mais provável de se concretizar) se tivermos vivências suficientes para apontar um nível alto de frequência sobre o assunto, independentemente da “estatística” fazer sentido ou não.

Suponha que alguém tenha tido uma experiência negativa com uma companhia aérea e conheça outra pessoa que também passou por problemas. Nesse caso, a ilusão de frequência fará esse indivíduo acreditar que a empresa em questão não é confiável, desconsiderando a possibilidade de que ambos tenham sido casos isolados — exceções, não regras.

Quais são os principais atalhos mentais de um investidor?

Embora investir seja uma prática que, idealmente, requer a análise minuciosa de estatísticas e informações reais, é comum que muitos caiam no erro de utilizar métodos heurísticos e impulsivos ao lidar com o próprio dinheiro. 

Disponibilidade, ilusão de frequência, take the best, representatividade e escassez são alguns dos atalhos mentais utilizados por investidores. Entenda como acontece cada um, dentro do contexto financeiro:

Exemplo de heurística da disponibilidade

Imagine um investidor que, recentemente, leu sobre a valorização de uma empresa de tecnologia, ou ficou sabendo que este setor está em pleno crescimento. 

Se, algum tempo depois, essa pessoa procurar uma ação para incluir no seu portfólio, provavelmente vai apostar no sucesso dos ativos emitidos por empresas do tipo, acreditando que essas poucas referências passadas são suficientes para avaliar o possível sucesso da aplicação.

No entanto, a compra de uma ação nunca é tão simples e deve considerar, por exemplo, o grau de maturidade da companhia, o cenário macroeconômico, o histórico de rentabilidade, entre outros fatores.

Exemplo de heurística da ilusão de frequência

Quem inicia no mercado financeiro não se sente imediatamente à vontade para operar com renda variável, o que é compreensível. 

No entanto, há investidores que já ouviram falar sobre grandes perdas daqueles que investiram em ações e, por isso, têm a ilusão de que a frequência com a qual o prejuízo acontece é alta. 

Por conta desse viés cognitivo, acabam deixando essa possibilidade de investimento de lado, em vez de aprender mais sobre o assunto e eventualmente explorar ativos dessa classe também.

Exemplo de heurística take the best

Suponha que um investidor está indeciso sobre qual ação investir, considerando os ativos emitidos por duas empresas diferentes. 

Caso tenha ouvido falar anteriormente que a companhia A apresentou um crescimento recente, vai optar por ela, sem sequer avaliar outros indicadores financeiros relevantes de ambas as opções.

Muitas vezes, esse tipo de heurística também acontece quando o indivíduo, por qualquer motivo, está predisposto a tomar uma decisão específica. Nesse sentido, vai concentrar os seus esforços em buscar fatos que evidenciem a sua opinião sobre o ativo, deixando de lado aqueles que provarem o contrário.

Exemplo de heurística da representatividade 

Atualmente, bancos digitais têm sido destaque no mercado financeiro, dada a natureza tecnológica, conveniente e inovadora de suas operações. Se olharmos para o passado, é fácil identificar nomes que surgiram com essa premissa e hoje são gigantes no setor.

Um investidor guiado pela heurística da representatividade pode ser levado a crer que qualquer banco do tipo tem chances de se valorizar, sem considerar outros fatores de avaliação dos ativos. Afinal, o cérebro está equivocadamente resumindo as operações dessa companhia ao que normalmente se aplica em relação ao seu ramo geral de atuação.

Exemplo de heurística da escassez

Um investidor está acompanhando a oferta inicial de uma criptomoeda que promete revolucionar o mercado financeiro. 

Ele percebe que o lançamento é limitado e, por isso, muitas pessoas estão interessadas em adquirir o ativo — o que pode levar à escassez de disponibilidade em um futuro próximo. 

Temendo perder a oportunidade de investimento, o investidor decide comprar um grande volume da criptomoeda imediatamente, mesmo sem entender completamente sua tecnologia ou potencial de mercado.